ASSOCIAÇÃO DE PROTEÇÃO VEICULAR
A priori, devemos saber as principais diferenças e definições entre as associações e seguradoras.
As Associações são criadas, pura e simplesmente, para facilitar a negociação entre os participantes do programa de proteção automotivo, participantes estes com interesse na negociação, proteção de seus veículos.
Para elucidar a simplificação basta imaginar o impasse ocasionado caso a contratação de uma oficina, para reparar um veículo acidentado, exigisse a assinatura de todos os integrantes do programa; seria, sem dúvida, o caos, que inviabilizaria o Sistema. Neste caso, percebe-se a importância da constituição da Associação, atuando como intermediária entre os verdadeiros titulares da proteção automotiva (associados) e os eventuais fornecedores de produtos e serviços (oficinas, por exemplo).
Nesse diapasão, a associação é caracterizada como uma associação civil, legalmente constituída, atuando, portanto, em ramo completamente diverso da competência de atuação das seguradoras, tendo em vista que opera com Proteção Automotiva e não com Seguros Privados.
Todavia, insta ressaltar um único parâmetro passível de comparação, apontado no quesito das finalidades e presentes em ambos os institutos, qual seja, a proteção do bem (no caso, veículos). Contudo, vislumbra-se praticamente esta equivalência, pois temos uma incontável série de diversidades, a iniciar-se por mais uma finalidade do seguro que inexiste na Proteção Automotiva, o lucro.
Por isto, impossível e forçosa se faz a tentativa de criar identidade entre ambos. Os institutos do seguro e da proteção automotiva são completamente distintos, tendo cada um natureza jurídica própria, completamente diversa da do outro.
Embora a gestão da Proteção Automotiva não traga qualquer similitude com o Seguro, conforme veremos a seguir, a sua teoria de fato traz alguma semelhança, pelo simples fato de que ambos baseiam-se no mutualismo, definido pela própria Seguradora relativamente ao seguro como:
MUTUALISMO – Princípio fundamental, que constitui a base de toda operação de seguro. É pela aplicação do princípio do mutualismo que as empresas de seguros conseguem repartir os riscos tomados, diminuindo, desse modo, os prejuízos que a realização de tais riscos poderia lhe trazer.
Tal princípio, entretanto, aplica-se igualmente à Proteção Automotiva, com a seguinte ressalva:
Nos seguros em que há repartição dos riscos conforme a definição supracitada, o objetivo é diminuir ou evitar os prejuízos das seguradoras. Só acontece a título de exceção.
No caso da Proteção Automotiva, a repartição dos riscos ocorre como regra, e implica em que todos os participantes do programa suportem os prejuízos sofridos por alguns.
No caso das seguradoras, a menor incidência de eventos danosos aumenta o lucro das mesmas, sendo que o segurado possui a informação de quanto dos valores pagos foi de fato destinado ao pagamento dos sinistros.
Já a proteção automotiva, a menor incidência de eventos danosos beneficia direta e exclusivamente aos participantes que arcam com um valor reduzido das indenizações, através do rateio.
Do mesmo modo, uma das atividades visa o lucro, e a outra, visa o benefício mútuo dos optantes. Percebe-se claramente que, embora ambas as atividades sejam baseadas no mutualismo, as diferenças saltam aos olhos.
Ademais, essa similitude/distinção não se reduz somente ao seguro e à proteção automotiva, ocorrendo, também, com o desconto de títulos e a operação de factoring, ambos caracterizados pela transferência de títulos a terceiros, mediante o recebimento imediato de seu valor, com dedução de um valor (ou percentual) previamente ajustado entre as partes.
Entretanto, tal semelhança, exatamente como na hipótese em discussão, não é suficiente para confundir os dois institutos, caracterizando o primeiro como «desconto», assumindo o cedente a responsabilidade pela solvência do devedor, enquanto nas operações de factoring, como transferência de ativo, o cedente responde apenas pela existência do débito ou pela evicção.
Outro exemplo da distorção das alegações das Seguradoras são as famigeradas reservas, essenciais no seguro para a garantia dos segurados que pagam o prêmio antecipadamente para, depois, se ocorrido o sinistro, pagar a indenização. Cumpre notar que a medida que desaparece o risco — venceu o prazo do seguro — a reserva é liberada, podendo ser livremente utilizada no negócio.
Na proteção automotiva, a apuração do prejuízo precede ao pagamento do rateio e, feito este, os valores são divididos e quando arrecadados, são imediatamente utilizados na liquidação dos prejuízos, de tal forma que, ao se falar em reservas, elas seriam constituídas, no momento exato de sua liberação, o que seria, sem dúvida, um contrassenso.
Definitivamente, portanto, não existe na relação das associações aqui entabulada a figura do “fornecedor de produtos e serviços”, nem do “consumidor”, onde um atua no mercado em busca de lucro, e o outro, sem vínculo algum com o primeiro, consome seus produtos.
No caso em tela, ambos (associação e associados) possuem os mesmos objetivos e atuam juntos, inclusive assumindo obrigações conjuntamente, sem nenhuma das partes obterem lucro ou vantagem alguma. Assim, qualquer prejuízo sofrido pela Associação é também um prejuízo sofrido pelos associados, visto que estes pagam tudo de forma distribuída.
Importante salientar, diante das explanações apresentadas, que a aplicação do codex consumerista seria absolutamente indevida, tendo em vista a inexistência de qualquer relação de consumo. Variados fatores deixam claro que a relação em questão é associativa, com a finalidade beneficiar mutuamente os associados, e não uma relação comercial de seguros privados. Em momento algum o associado é levado a acreditar que esteja em uma relação consumerista.
Desta forma, ao diferenciar as associações dos seguros automotivos, verifica-se que comparar associação com seguradora no que tange à relação de consumo é tão absurda que, caso esta o fosse, a figura do fornecedor e do consumidor se confundiriam em uma só, visto que a Associação é tão somente a personificação jurídica de seus associados, coletivamente. A Associação não presta serviços de qualquer natureza a seus associados ou a quem quer que seja, portanto, realça, não há o que se falar que relação de consumo.
Ainda, concretizando a distinção, mister se faz indiscutível que a natureza jurídica da proteção automotiva é distinta da do seguro. O contrato de seguro está definido no art. 757 do código civil, que aduz: “Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados”.
É, sem dúvida, na lição de Antônio Chaves, tratado de Direito Civil, um contrato típico, pois, além de ter denominação própria, é previsto e regulado por lei que lhe traça a fisionomia.
Nessa visão, nota-se que não há qualquer relação, mesmo que forçosa, do sistema associativo de mútua assistência com o seguro, que prevê pagamento de prêmio, ou seja, antecipação de pagamento para resultado incerto.
Para que qualquer outro negócio jurídico possa confundir-se com o seguro, indispensável apresente todos os requisitos específicos do tipo definido pelo art. 757 Código Civil, a saber:
a) que alguém, denominado segurador, garanta interesse legitimo de outrem, denominado, segurado;
b) a prestação dessa garantia pressupõe o pagamento de uma importância, chamada prêmio;
c) e, finalmente, a obrigação do segurador visa garantir os interesses do segurado contra os riscos previstos.
Desta forma, o primeiro empecilho à identidade combatida é o fato da seguradora constituir, conforme se depreende do exposto acima, um contrato “sinalagmático”, através do qual o segurador se compromete a indenizar o segurado pelo prejuízo resultante de riscos futuros, previstos no contrato, e esse a pagar-lhe em contraprestação o prêmio ajustado. É tipo do contrato tradicional em que as partes se colocam, uma em oposição a outra, cada uma defendendo interesses próprios, até se chegar a um denominador comum, que permite a celebração do ajuste. Não importa tenha tal contrato se originado do mutualismo e que o sucesso do segurador esteja condicionado a reunião por ele de outros diversos segurados que Ihes permitam formar um fundo, através do qual consiga faze face aos sinistros. Fato é, que a seguradora está obrigada, contratualmente, a indenizar o segurado em caso de sinistro, sendo, portanto, imprescindível a existência de um “caixa” (fundos) para garantir a obrigação contratual.
Na proteção automotiva, contudo, exercida através de uma associação de ajuda mútua, o valor dos ressarcimentos que, no seguro, são indenizações e de responsabilidade do segurador, é rateado entre os associados, inclusive, entre a vítima do fato. Não há, assim, uma oposição entre os participantes, como nos contratos tradicionais em que cada parte defende interesses próprios em oposição aos da outra; o objetivo de todos é comum, tornando os interesses individuais totalmente irrelevantes, diante daquele representado pelo grupo. É o contrato, chamado por Ascarelli como plurilateral exatamente, porque, ao contrário dos contratos tradicionais, não há relação jurídica dos participantes entre si, mas de cada um deles com o todo, vejamos:
À pluralidade corresponde a circunstância de que os interesses contrastantes das várias partes devem ser unificados por meio de uma finalidade comum; os contratos plurilaterais aparecem como contratos com comunhão de fim. Cada uma das partes obriga-se, de fato, para com todas as outras, e para com todas as outras adquire direitos; é natural, portanto, coordená-los, todos, em torno de um fim, de um escopo comum. (ASCARELLI 1969, p.271)
Tal entendimento, aliás, foi manifestado pelo ilustre jurista, Dr. Adalberto de Souza Pasquaiotto, professor adjunto da PUC/Rio Grande do Sul, no Seminário promovido pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal e aprovado por unanimidade:
O contrato de ajuda mútua será plurilateral e auto-organizativo, repartindo custos e benefícios exclusivamente entre os participantes, mediante rateio. Sua diferenciação do seguro capitalista e da previdência privada é a autogestão, tal como permitido pele Lei n. 9656/1998, para os planos de saúde.
O fato é que, no contrato plurilateral, exemplificado pela proteção automotiva, todos os participantes são igualmente e ao mesmo tempo, credores e devedores uns dos outros. Tal circunstância, por si só, já impede a confusão entre os dois institutos.
Por outro lado, também não há que se falar em prêmio na proteção automotiva. De fato, prêmio é um valor recebido antecipadamente pela seguradora, e por ele é calculado diante de necessidade de satisfazer as seguintes contas:
(a) despesas indispensáveis ao funcionamento da empresa;
(b) formação de um fundo de recursos responsável pelo pagamento das eventuais indenizações a serem exigidas quando da materialização dos riscos previstos na apólice;
(c) e finalmente, os seus lucros.
Ocorre que na proteção automotiva não há recolhimento de valor antecipado ou captação. O pagamento pelo associado somente ocorre após apurado o valor das indenizações, sendo o mesmo distribuído entre os participantes.
Não há margem de lucro, seja da associação que simplesmente se encarrega de arrecadar a cota parte de cada um dos associados nos rateios para, incontinente, transferi-la aos prestadores de serviços (oficinas, casas de peças, etc.) ou dos associados cujos veículos desapareceram ou não têm condições de, economicamente, ser recuperados; e, nem dos associados, os quais simplesmente recebem as indenizações necessárias a cobrir o seu prejuízo.
Ademais, não há que se falar em qualquer compromisso de prestação de serviços da associação com relação a seus associados. Na verdade, ela existe para viabilizar o programa que tornar-se-ia inviável caso os participantes em todas oportunidades tivessem de firmar contratos com os fornecedores (avaliadores, vistoriares, oficinas, lojas de peças, etc.).
Por isso mesmo, é irrelevante para a associação se o valor das indenizações aumenta ou diminui, já que tal oscilação repercutirá exclusivamente, no maior ou menor valor do rateio. Não há, assim, perigo de insucesso da associação que não enfrenta qualquer risco, já que todo valor passível de ressarcimento, maior ou menor, é simplesmente desmembrada entre os participantes do plano.
Fonte de pesquisa: http://npa.newtonpaiva.br/letrasjuridicas/?p=868